sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Preconceito não é Burrice

Roberto Cavalcanti

Um slogan bastante surrado hoje em dia, freneticamente repetido sobretudo por gays e esquerdistas, é de que “preconceito é burrice”. Entretanto, pretende-se aqui demonstrar que tal afirmação não passa de um lugar-comum falacioso e totalmente vazio de significado. Preconceito significa pré-julgamento. Significa extrair de determinado objeto, lugar ou pessoa uma conclusão antecipada sem que ela possa ter um decisivo amparo da razão. Pré-julgar é algo inevitável. Fazemos pré-julgamentos a todo instante. Exemplos são inúmeros, e importa aqui citar aqueles que demonstram que o preconceito pode não ser burro. Um exemplo é uma pessoa que instada a decidir entre almoçar entre um restaurante bem conservado e outro que esteja com as suas paredes descascando, faça a primeira escolha. Esta escolha não tem nada de burra. É perfeitamente possível que o restaurante que foi preterido em função daquelas más condições ofereça uma boa comida ou até melhor que o outro. Entretanto, é bastante razoável supor que o desleixo dos proprietários em conservar o estabelecimento interfira na qualidade da comida, de modo que, embora a decisão guiada pelo preconceito não seja racional, pode ser razoável. Com efeito, nem tudo o que não é racional, é irracional.Irracional é aquilo que contraria a razão. Um exemplo são os dogmas católicos e milagres, que não contrariam a razão,mas que não são explicados pela razão. Outro exemplo é o preconceito. Baseado nisso, chamar preconceito de burrice, por não ter o amparo decisivo da razão, é o mesmo que chamar os católicos de burros por crerem em dogmas e milagres que não podem ser explicados pela razão. O princípio é o mesmo. Preconceito não é pecado. Nunca foi exorcizado pela religião, pelo menos antes do Concílio Vaticano II, mas sua demonização provém do iluminismo, que não aceita julgamentos não-empíricos em seu racionalismo extremado. Não se deve confundir o preconceito com a discriminação. O preconceito é o pré-julgamento, enquanto a discriminação é o preconceito em operação. O preconceito é a idéia abstrata e a discriminação o ato concreto. Entretanto, ambos podem ser tecnicamente ou moralmente bons. Um lugar onde costumamos exercer prodigamente os preconceitos e discriminações é no supermercado. Lá, pré-julgamos um molho de tomate como bom só por provir da Itália, um azeite como bom só por provir de Portugal, um bacalhau como bom só por provir da Noruega, e aí, em uma atitude totalmente discriminatória, compramos tais produtos, preterindo os demais. Significa com isso que todo molho, todo azeite e todo bacalhau provenientes de tais países são bons? Obviamente que não, pois dificilmente teríamos condições de experimentar todas as marcas vendidas em tais países para emitir conclusão precisa. Ao vermos um sorvete da marca do supermercado, acabamos por pré-julgá-lo como ruim, e aí compramos o tradicional sorvete Kibon ou Nestlé, em mais uma atitude discriminatória.

O supermercado é um dos lugares onde mais exercemos preconceitos e discriminações 

Quem nunca ouviu falar também da marca de eletro-eletrônicos CCE, cujo apelido pejorativo ficou conhecido como "Começou Comprando Errado"? Quem nunca teve uma experiência desagradável ao adquirir um aparelho da marca? Essas experiências ruins alimentam os preconceitos de toda uma coletividade para com a marca, que acaba sendo discriminada diante de uma outra marca de melhor reputação. CCE: marca de tradicional preconceito entre consumidores brasileiros Um outro preconceito, que é bastante comum entre brasileiros, é o de evitar a compra de produtos chineses. Pela nossa experiência, sabemos que produtos chineses, sobretudo eletrônicos, são de baixa qualidade, e quase sempre acabam se deteriorando rapidamente. Entretanto, não temos a exata ciência de que todos os produtos chineses, mesmo os eletrônicos, sejam de baixa qualidade. Porém, é no mínimo imprudente o consumidor absolutamente livre de preconceitos com produtos chineses, pois poderá experimentar possíveis dissabores em suas aquisições. Assim, como classificar de "burro" o preconceito a produtos chineses, já que a marcada experiência do brasileiro com tais produtos não é boa? Agora pergunto: tais preconceitos e discriminações são burras ou arbitrárias? Claro que não! Se os preconceitos e discriminações podem ser aplicados a lugares e coisas, por que cargas d'água não poderiam ser aplicados a pessoas? Uma pessoa pode escolher não querer receber transfusões de homossexuais em razão do histórico de doenças ligadas ao homossexualismo e receber a pecha de "homofóbico" ou "intolerante". Este pré-julgamento é perfeitamente razoável, considerando que os homossexuais têm 20 vezes mais chances que os héteros de estarem contaminados, segundo a OMS. Ora, a pessoa que apesar de desconhecer essa informação, rejeita o sangue homossexual por preconceito, é diligente com sua saúde e amor à vida e, por isso, nada tem de burra, pois seu preconceito acaba se confirmando por estatísticas favoráveis à razoabilidade de sua decisão. Mais um exemplo de preconceito que não é burro é a decisão de um empregador não contratar ex-presidiários. Não significa que todo ex-presidiário volte a delinqüir e com isso prejudicar o empreendimento, mas guiado pela prudência o empregador prefere contratar pessoas sem histórico prisional para não experimentar possíveis problemas. Trata-se certamente de um preconceito, guiado pela prudência, experiência e não pela razão, pois não há estatísticas informando sobre a reiteração da prática criminal por ex-presidiários a fim de amparar tal decisão. Novamente é um preconceito que nada tem de burro. A reputação de certas coisas, lugares e pessoas não é tomada arbitrariamente, mas é pré-conhecida em virtude de suas experiências históricas. Jogar a experiência no lixo só para se dizer "sem-preconceitos" não é, por certo, um gesto de sabedoria. Muito pelo contrário, trata-se de uma estupidez sem tamanho abdicarmos da experiência que nutrimos em toda nossa vida, seja ela proveniente de experiência pessoal ou do intercâmbio com pessoas mais velhas. Preconceitos também podem salvar vidas. Eu suspeito que o gênero humano teria sido extinto nos primeiros anos caso não houvessem preconceitos, pois a ciência era extremamente incipiente e o homem guiava-se sobretudo pela experiência. Refletindo a respeito, um amigo citou-me um exemplo de bastante sabedoria. Se você como homem primitivo observasse animais comendo certos cogumelos, poderia ter uma noção que deles poderia se alimentar, ainda que não totalmente segura. Não fosse esse preconceito, provavelmente o homem arriscaria sua vida comendo cogumelos venenosos para se dizer "absolutamente livre de preconceitos". Outro exemplo bastante útil hoje em dia são os testes de laboratório com chimpanzés. Guiando-se por um raciocínio probabilístico, não totalmente seguro, portanto, conservamos preconceitos de que aquilo que não faz mal a este macaco provavelmente não faz mal ao ser humano, já que a fisiologia deles é muito próxima a nossa, mas não 100% igual. Estes são exemplos de preconceitos que podem salvar vidas, e por conta da proximidade ao nosso instinto de auto-conservação - princípio basilar da moral - são moralmente bons. Desta forma, viemos a constatar através destes exemplos que burros são aqueles papagaios esquerdistas que, guiados por conclusões irrefletidas repetem freneticamente slogans falaciosos. Há preconceitos guiados por reflexões arbitrárias, assim como há preconceitos guiados pela razoabilidade. Se há uma coisa e outra, tachar o próprio preconceito por burrice é uma generalização extremamente burra.

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